No dia 09 de maio passado, o papa Francisco publicou a Bula de Proclamação do Jubileu Ordinário do Ano 2025, Spes non confundit, ou seja, “a esperança não engana” (Rm 5,5). Para que “a quantos lerem esta carta que a esperança lhes encha o coração”. O papa com isso propõe que a esperança seja a mensagem central deste Ano Santo. Nos lembramos bem do último jubileu, Ano 2000, e todo esforço de evangelização. O primeiro jubileu foi celebrado em 1300, mas suas raízes estão fincadas na Palavra de Deus.
Em sua Bula, o papa lembra alguns eventos importantes para a Igreja que estão “aniversariando” durante o jubileu e que podem ser “revisitados”. Entre eles, quero lembrar o Concílio de Niceia, o primeiro grande Concílio Ecumênico da Igreja, ocorrido em 325 e, portanto, a 1700 anos. Bem como o último Concílio, o do Vaticano II, encerrado em 08 de dezembro de 1965, e, portanto, a 60 anos. São fruto da experiência sinodal da Igreja. O papa Francisco tem incentivado justamente este modo de ser sinodal, em todas as suas instâncias.
“É bom lembrar que já em diversas ocasiões, desde os tempos apostólicos, os Pastores se reuniram em assembleia com a finalidade de tratar temáticas doutrinais e questões disciplinares. Nos primeiros séculos da fé, multiplicaram-se os Sínodos tanto no Oriente como no Ocidente cristão, mostrando como era importante guardar a unidade do Povo de Deus e o anúncio fiel do Evangelho. O Ano Jubilar poderá ser uma importante oportunidade para tornar concreto este modo sinodal, que hoje a comunidade cristã sente como expressão cada vez mais necessária para melhor corresponder à urgência da evangelização: todos os batizados, cada qual com o próprio carisma e ministério, se sintam corresponsáveis pela mesma a fim de que muitos sinais de esperança deem testemunho da presença de Deus no mundo” (FRANCISCO, Spes non confunditn.17).
Desde o último jubileu, convocados pelo papa João Paulo II para “navegarmos em águas mais profundas”, com um mutirão de evangelização e mudadas as condições de nossas sociedades, temos nos preocupado com a iniciação dos novos cristãos, agora, não mais somente recém-nascidos, mas muitos jovens e adultos. Em nossa diocese, mas dentro de uma perspectiva geral da Igreja, temos trabalhado pela Iniciação Cristã de Adultos com inspiração catecumenal. Foi um pedido expresso do Concilio Vaticano II em seu documento sobre a liturgia: “Restaure-se o catecumenado dos adultos, com vários graus, a praticar segundo o critério do Ordinário do lugar, de modo que se possa dar a conveniente instrução a que se destina o catecumenado e santificar este tempo por meio de ritos sagrados que se hão-de celebrar em ocasiões sucessivas” (Sacrosanctum Concilium n.64). O Ritual da Iniciação Cristã de Adultos (RICA) é resposta a esse pedido do Concílio. Já o Concílio de Niceia havia feito recomendações sobre a seriedade deste processo e do tempo necessário para a iniciação cristã.
Expondo alguns temas de nossa fé que estão diretamente relacionados com a esperança, o papa lembra da morte de Cristo pela nossa salvação e de nossa morte e como o batismo é capaz de transfigurar esse drama que nos separa de nossos entes queridos.
“E se diante da morte, dolorosa separação que nos obriga a deixar os nossos entes queridos, não é possível qualquer retórica, o Jubileu oferecer-nos-á a oportunidade de descobrir, com imensa gratidão, o dom daquela vida nova recebida no Batismo, capaz de transfigurar o seu drama. É significativo repensar, no contexto jubilar, como este mistério foi compreendido desde os primeiros séculos da fé. Durante muito tempo, por exemplo, os cristãos construíram a pia batismal em forma octogonal, e ainda hoje podemos admirar muitos batistérios antigos que mantêm esta forma, como em São João de Latrão na cidade de Roma. Indica que, na fonte batismal, se inaugura o oitavo dia, isto é, o da ressurreição, o dia que ultrapassa o ritmo habitual, marcado pela cadência semanal, abrindo assim o ciclo do tempo à dimensão da eternidade, à vida que dura para sempre: esta é a meta para a qual tendemos na nossa peregrinação terrena (cf. Rm 6, 22)” (FRANCISCO, Spes non confundit n.20).
Todo o pontificado do papa Francisco tem sido marcado pela esperança e pela alegria. Em geral, já a partir dos documentos que publica, os títulos contêm palavras que expressam alegria, como Gaudium, Laetitia (alegria) e Spes (esperança). Isto não significa esquecer as dificuldades e problemas do mundo atual. Cada época e cultura teve seus desafios. Temos os nossos. Mas o papa não adota um tom privilegiadamente condenatório ou apocalíptico e sim acolhedor e acalentador. O Espírito Santo age também em nosso mundo. É a atitude de Jesus que chama de “Felizes” ou “Bem-aventurados” aqueles que o mundo chamava e continua chamando de “desgraçados”, os “sem-graça”: famintos, sedentos, perseguidos, excluídos em geral, “os que choram”. A mensagem do Evangelho é para todos os homens e mulheres, mas sobretudo para eles, mensagem de vida e esperança. Que deve começar aqui, mas se realizará como vida eterna e feliz, porque em plena comunhão com Deus.
“Então, que será de nós depois da morte? Com Jesus, além deste limiar, há a vida eterna, que consiste na plena comunhão com Deus, na contemplação e participação do seu amor infinito. Tudo o que agora vivemos na esperança, vê-lo-emos então na realidade. (...) Então, o que caracterizará tal plenitude de comunhão? O ser feliz. A felicidade é a vocação do ser humano, uma meta que diz respeito a todos.
Mas, o que é a felicidade? Que felicidade esperamos e desejamos? Não uma alegria passageira, uma satisfação efêmera que, uma vez alcançada, volta sempre a pedir mais, numa espiral de avidez em que o espírito humano nunca se encontra saciado, antes sente-se cada vez mais vazio. Precisamos duma felicidade que se cumpra definitivamente naquilo que nos realiza, ou seja, no amor, para se poder dizer já agora: sou amado, logo existo; e existirei para sempre no Amor que não desilude e do qual nada e ninguém me poderá separar” (FRANCISCO, Spes non confundit n.21).
Nós, cristãos, somos “peregrinos da esperança”. E nossa esperança, justamente por ser “cristã”, não é apenas para nós, mas para o mundo, para todos os homens e mulheres, afinal, Cristo se encarnou e morreu por todos. Ensinou que devemos ser sal e luz no mundo em que vivemos e a ele dar sentido (Mt 5,13-16). E o apóstolo Pedro, através da lembrança de sua comunidade, nos ensinou a dar a razão de nossa esperança a quem nos pedir (1Pd 3,15).
O papa Francisco escolheu para o jubileu a afirmação de Paulo: “a esperança não engana” (Rm 5,5). Paulo, mais do que qualquer outro, não se deixou abater pelas dificuldades ou pela sua pequenez diante da imensidão da missão. Soube vivê-la com a Graça do Senhor. Semeou o Evangelho com fartura, para que nós o colhêssemos em abundância. E nos alertou: “Sejam alegres na esperança, pacientes na tribulação e perseverantes na oração” (Rm 12,12). “Não se deixe vencer pelo mal, mas vença o mal com o bem” (Rm 12,21). Nos preparemos para nesse ano jubilar sermos ainda mais “alegres na esperança”.
Artigo de Padre Belini, colunista do Jornal Servindo